A receptação é um crime previsto no artigo 180 do Código Penal, e pode atingir até mesmo quem age sem má-fé, mas comete erros ao comprar objetos de origem duvidosa.
Antes de tudo, é importante entender que situações como essa são mais comuns do que se imagina. A pessoa compra um celular, uma bicicleta ou outro item por um preço muito atrativo e, algum tempo depois, descobre que comprou um bem roubado. Em seguida, surge a dúvida inevitável: “Posso ser processado por receptação?”
O que caracteriza o crime de receptação segundo a lei?
Primeiramente, vale destacar que a legislação brasileira trata a receptação de duas formas distintas: dolosa e culposa. Ambas estão previstas no artigo 180 do Código Penal, mas possuem implicações jurídicas diferentes.
Receptação dolosa ocorre quando o comprador sabe que o item é fruto de crime — como roubo ou furto — e, ainda assim, aceita, compra, transporta ou guarda o objeto. Nesse caso, a pena é de 1 a 4 anos de reclusão, além de multa.
Por outro lado, existe também a receptação culposa, que se aplica quando a pessoa não sabia da origem ilícita do bem, mas deveria ter desconfiado pelas circunstâncias da negociação. Ou seja, mesmo que não haja intenção criminosa, o descuido pode ser interpretado como negligência. A pena, nesse cenário, é mais branda: detenção de 1 mês a 1 ano, com possibilidade de multa e, em certos casos, substituição por penas restritivas de direitos.
Como saber se posso ser acusado de receptação culposa?
A princípio, muitas pessoas acreditam que apenas não saber da origem do bem basta para se livrar de qualquer problema. Contudo, a Justiça considera não só o que você sabia, mas também o que deveria saber no momento da compra.
Em outras palavras, a lei avalia os sinais de alerta que foram ignorados — e eles são fundamentais para configurar a receptação culposa. Veja alguns exemplos:
- Preço muito abaixo do praticado no mercado;
- Ausência de nota fiscal ou comprovante de origem;
- Vendedor sem referências, que some após a venda;
- Transações em locais suspeitos ou com abordagens inusitadas (como vendas de porta em porta, na rua, etc.).
Analogamente, ignorar essas evidências pode demonstrar imprudência. Dessa forma, mesmo quem agiu com boa intenção pode ser responsabilizado se agiu com descuido evidente.
Quais cuidados evitar para não ser responsabilizado por receptação?
Antes de mais nada, é fundamental adotar uma postura cautelosa ao fazer qualquer compra, especialmente de produtos usados. Certifique-se de exigir comprovantes, verificar a procedência e desconfiar de preços muito abaixo do valor usual.
Além disso, sempre prefira comprar de vendedores conhecidos ou lojas registradas. Em outras palavras, evitar negócios “bons demais para ser verdade” é o melhor caminho para não se envolver com a receptação, mesmo que de forma culposa.
Por exemplo, ao comprar um celular, confira o IMEI no site da Anatel e peça a nota fiscal. Isso demonstra diligência e reforça a sua boa-fé em caso de qualquer eventualidade.
Fui surpreendido com a notícia de que comprei algo roubado. O que fazer?
Nesse tipo de situação, a recomendação é clara: não tente resolver sozinho. Ainda mais se houver uma abordagem policial, intimação ou denúncia. O mais adequado é procurar imediatamente um advogado.
Com isso, é possível apresentar documentos, explicar os detalhes da negociação e demonstrar que a compra foi feita de boa-fé. Frequentemente, essa postura contribui para afastar a acusação de receptação dolosa — e até mesmo a penalização por receptação culposa, se houver provas suficientes da sua diligência.
Se ainda estiver com o objeto, o ideal é não devolvê-lo diretamente ao vendedor ou ao suposto dono, sem orientação legal. Dependendo da forma como agir, isso pode complicar ainda mais o cenário jurídico.
Existe diferença entre receptação e receptação qualificada?
Sim. Apesar de pouco conhecida, a receptação qualificada é uma forma mais grave do crime, aplicada quando a prática envolve atividade comercial ou industrial, ou seja, quando a pessoa revende bens de origem ilícita como se fosse um negócio.
Por exemplo, um comerciante que compra peças intencionalmente de carros furtados para revenda pode ser enquadrado na forma qualificada do artigo 180, com pena de 3 a 8 anos de reclusão, além de multa. Nesse contexto, a Justiça entende que há um favorecimento sistemático ao crime original (furto, roubo, etc.), o que justifica punição mais severa.
A boa-fé pode livrar alguém da acusação de receptação?
Ainda que muitos acreditem que alegar boa-fé seja suficiente, a realidade é mais complexa. O Judiciário exige provas concretas de que o comprador agiu com o devido cuidado.
Por isso, guardar notas, trocas de mensagens, prints, recibos e dados do vendedor é essencial. Isso significa que, quanto mais elementos você apresentar para demonstrar que não teve culpa ou que agiu de forma diligente, maior a chance de afastar qualquer tipo de responsabilização criminal.
Portanto, é essencial demonstrar a boa-fé com clareza — e não apenas alegar que ela existiu.
Como a receptação impacta o comprador inocente?
Apesar de parecer injusto, é possível que uma pessoa sem qualquer intenção criminosa enfrente sérias consequências jurídicas por receptação culposa. Além da investigação policial e de um eventual processo, podem surgir:
- Apreensão do bem adquirido;
- Danos à reputação;
- Custos com advogado e honorários;
- Ansiedade e desgaste emocional.
Logo, o impacto vai além da esfera penal. Em muitos casos, o simples envolvimento com um produto de origem ilícita pode gerar consequências sociais e financeiras duradouras.
Como se proteger legalmente ao adquirir bens usados?
Sobretudo, a melhor forma de se proteger é agir sempre com cautela e documentação. Veja algumas práticas recomendadas:
- Exija nota fiscal ou recibo com dados do vendedor;
- Pesquise a média de preço do produto no mercado;
- Evite comprar em locais sem estrutura formal;
- Solicite dados completos do vendedor (nome, CPF, telefone, endereço);
- Armazene prints de conversas e fotos do anúncio.
Assim como o ditado “o barato pode sair caro”, adquirir bens sem cautela pode acabar custando sua tranquilidade — e até sua liberdade.
Concluindo,
Por fim, comprar algo que posteriormente se revela roubado pode configurar o crime de receptação, mesmo que sem intenção direta. A chave está nas circunstâncias da negociação e nos cuidados tomados pelo comprador.
Dessa forma, quem adota práticas responsáveis, documenta bem cada transação e desconfia de ofertas suspeitas consegue evitar problemas legais com mais segurança.
Ou seja, a boa-fé não é apenas um sentimento — é uma conduta que precisa ser provada. Portanto, esteja sempre atento, porque, no final das contas, agir com responsabilidade é a melhor proteção contra a receptação.
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